Le Bal Masqué

Masquerade! Every face a different shade...

Friday, October 19, 2012

Trampolim


Ela vai olhar. Tenho certeza que vai. Eu, parado aqui em cima, satisfeito como um alpinista que chegou ao topo do Everest, devo chamar a atenção. Estou na ponta da prancha, no ponto mais alto do trampolim. Nunca subi até aqui. Ela acha que me falta coragem, que sou um molenga, um frouxo. Ela nunca disse isso, claro, mas eu sei que pensa assim. Ela prefere o João. O João, sim, joga bola, faz judô, nada até borboleta. Eu tenho medo de mergulhar de cabeça. Sempre dou barrigada. A pele fica toda vermelha, ardendo. Uma vergonha.
O que vai fazer quando me ver saltando? Quando me assistir entrando como uma flecha na água? Vai gritar? Vai aplaudir? Tenho de pular, já está todo mundo me observando. Menos ela. Até o cara que nadava na raia dois parou para ver.A moça que toma sol do outro lado do deck também desligou o celular e está me encarando, com jeito de quem desacredita que eu irei mesmo me jogar. Bem, que me aguardem!
Vou esperar mais um pouco, só mais um segundo, ela virar o rosto nesta direção. Olha, olha, olha! Eu estou aqui! Droga. Está ocupada. Está conversando com a amiga, aquela loura de óculos gigantes. Detesto a loura de óculos gigantes. Ela parece uma abelha. Vou começar a zunir, será que desse modo ela vai olhar para mim como olha para a abelhuda?
É sempre assim. Está atarefada demais, distraída demais. A Teca diz que ela vive no mundo da lua. Estranho isso, ela nunca para para ver a lua. Nem as estrelas. Nem o desenho que faço das estrelas. E o machucado no meu joelho, então? Acha que ela reparou? Dói para caramba.
Seus olhos jamais estão disponíveis. Passam pelas águas agitadas da piscina, pelo colorido das toalhas e boias das outras crianças, pelo celular que tocou, mas sem focar. Apesar do sol forte do meio-dia, para ela tudo é neblina. Esse jeito esquisito começou mais ou menos na mesma época que o papai saiu de casa. E eu virei um borrão no seu campo de visão, embaçado pelas suas constantes lágrimas.
Mas descobri como mudar isso. Vou ser radical – me jogar do trampolim mais alto do clube - para ela me notar, ter orgulho de mim. E vou fazer isso já!
Peraí, estou vendo direito? A cabeça dela está virando? Vira, vira, olha, olha, por favor... Sim! Finalmente! Ela está me vendo! Olha, eu aqui, ó! Eu preciso tanto do seu olhar, mãe!



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