Sunlight in a Cafeteria (1958)
Explicou-me a minha amiga Francesca, mestranda em literatura, que a descrição verbal de uma representação artística visual – seja pintura, escultura etc. -- é chamada de ecfrasis. A forma mais comum de ecfrasis é a poesia, mas nada impede que apareça em prosa.
Antes mesmo de saber disso, eu já pensava em escrever textos inspirados em quadros do Edward Hopper, pintor norte-americano cujas obras sempre me pareceram conter alto teor narrativo e incitavam a minha imaginação.
Aí vai minha primeira tentativa de ecfrasis hopperiana. Talvez tome gosto pelo exercício e outras, melhores, apareçam futuramente no Le Bal Masque.
Era um cara desiludido. Vez ou outra, permitia a si mesmo uma longa pausa em meio a um escaldante dia de trabalho. Tomava um café sem açúcar e fumava prazerosamente um ou dois cigarros. Mantinha a mente vazia, contemplando o parco movimento do lado de fora. Era um cara solitário.
Era uma mulher melancólica. Tinha mesa cativa, perto da porta, estrategicamente posicionada para aproveitar o solzinho da tarde. Entretanto, nem o calor nem a luz lhe traziam alguma alegria. Naquele refúgio público, ficava absorta em lembranças do passado ou remoia pequenos problemas cotidianos. Era uma mulher tensa.
Se percebiam, sem se notarem. Estavam cientes, mas ausentes.
Imóveis, em seus universos paralelos.
Ele nem chegou a desconfiar, mas ela cheirava à lavanda e fazia um pudim de pão igualzinho ao da mãe dele.
Ela nunca soube, mas ele tinha voz de tenor e gostava de rascunhar versos na madrugada.
Labels: ecfrase
11 Comments:
E o amor que uniria não existiu por causa de metro e meio. E pq preenchiam demais seus vazios. Com mais vazio.
Se fecharam tanto em seus mundinhos que esqueceram de viver. E logo ali, bem ao lado, poderia acontecer uma linda história.
Leio seus textos sempre. Muito emotivos e bem escritos. Parabéns! =)
Sabe o que dá vontade? Te propor quadros só para ver o que sai.
Marina é uma genial cronista das coisas do coração. Comece a pensar num livro. Dá samba. Ou rock. Ou samba-rock.
Obrigada pelos elogios, pessoal.
Rô, ainda sou uma amadora e tenho muitas letrinhas para digitar antes de pensar em livro.
Camila, gostei da idéia. Podem propôr alguna quadros, sim. Vai ser uma brincadeira divertida.
M, vc sempre foi romântica, mas está mostrando essa face de forma diferente nesse blog. Gostei!
Viu, senhorita? Rodrigo concorda comigo quanto ao livro. Vou escolher um e te mando, então!
MÁÁÁÁÁ! adoro. que beleza!
Mali, querida, adorei seu primeiro exercício ecfrástico, está bom demais mesmo!
I'm impressed with your site, very nice graphics!
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M.
Nunca exercitei a ecfrasis de obras, mas me pego ecfraseando a vida alheia a todo momento no metrô, no ônibus, na Cobal... E isso me serve pra muito e pra nada. Passo tempo fazendo isso, mas também já terminei um namoro ecfraseando um casal apaixonado na cafeteria do Georges Pompidou, Paris ao fundo, numa tarde fria de primavera... Mais ecfrasis, menos prozac!
Bjs,
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